segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Perícia aponta divergência entre arma de PMs e estojo apreendido no local de chacina de Quiterianópolis

 

Um exame de contraprova realizado pela Perícia Forense do Ceará (Pefoce) colocou em dúvida a participação de policiais militares na Chacina de Quiterianópolis, que deixou cinco mortos em outubro de 2020. Segundo o último laudo pericial do caso, há divergência entre um fuzil apreendido com os réus e um estojo localizado no local do crime. Entretanto, a perícia também levantou a possibilidade de manipulação no material enquanto ficou em custódia da Polícia Militar do Ceará (PMCE).

O Laudo Pericial de Eficiência Balística - o qual a reportagem teve acesso -, comparou o estojo 5.56 x 45mm apreendido em Quiterianópolis com estojos padrões do fuzil calibre 5.56.

Apresentou divergência a partir da análise dos elementos de ordem genérica (conformação e localização da marca de percussão), e dos elementos de ordem específica, representados pelos estriamentos finos deixados na espoleta pelo impacto de percussor, que são, por excelência individualizadores neste tipo de exames concluindo o perito que o estojo incriminado não teve sua espoleta percutida pelo atual percussor da arma de fogo 01".
PEFOCE
Em laudo pericial

A Pefoce ponderou que o exame de comparação balística procura individualizar o estojo com o atual sistema de percussão da arma e que "as peças internas da referida arma, em especial o extrator, ejetor, percussor e culatra do mecanismo de disparo e extração não possuem numeração que as individualizem, portanto, são completamente intercambiáveis com outras armas do mesmo modelo e somente a cadeia de custódia poderia garantir a integridade completa da arma".

Mas a cadeia de custódia do fuzil analisado levantou uma suspeita entre os peritos. Segundo o documento, "constatou-se que a arma não apresentava mais a etiqueta do lacre quando a mesma foi retirada da Perícia, resultado de possível manipulação da arma na corporação. Constatou-se também que o cano da arma estava obstruído com areia."

A arma de fogo esteve na posse da Polícia Militar do Ceará entre 1º de fevereiro deste ano e 26 de agosto último, quando retornou à Perícia Forense do Ceará para a realização da contraprova, o que aconteceu somente no dia 17 de novembro, com a presença de peritos, advogados de defesa e um representante do Ministério Público do Ceará (MPCE).

DEFESA PEDE SOLTURA DOS POLICIAIS

A Chacina de Quiterianópolis ocorreu em 18 de outubro de 2020. Criminosos invadiram uma residência onde acontecia uma festa e mataram a tiros Irineu Simão do Nascimento, de 25 anos; José Reinaque Rodrigues de Andrade, 31; Etivaldo Silva Gomes, 23; Antônio Leonardo Oliveira Silva, 19; e Gionnar Coelho Loiola, 31.

A investigação da Polícia Civil do Ceará (PCCE) indiciou quatro policiais militares pela matança: o tenente Charles Jones Lemos Júnior, o sargento Cícero Araújo Veras, o cabo Francisco Fabrício Paiva e o soldado Dian Carlos Pontes Carvalho. Eles foram denunciados pelo MPCE e viraram réus na Justiça Estadual. O sargento Cícero foi solto em outubro do ano corrente, enquanto os outros três PMs seguem presos.

O advogado Daniel Maia, que representa a defesa do tenente Charles Jones, afirmou que a contraprova de Eficiência Balística "desmoraliza de vez e totalmente a frágil acusação que pesa sobre o seu cliente. Agora não tem jeito, eles precisam ser soltos".

Fonte: Diário do Nordeste 

O Ministério Público já se pronunciou sobre o caso com a seguinte nota 



O Ministério Público do Estado do Ceará vem esclarecer à sociedade sobre a Ação Penal n. 0050171-56.2021.8.06.0171.

Referido processo apura os crimes contra a vida, praticados em 18/10/2020, no município de Quiterianópolis, episódio que ficou conhecido como a “Chacina de Quiterianópolis”, em que houve 5 (cinco) assassinatos por execução sumária, cuja autoria é imputada a policiais militares.

Recentemente, em atendimento a um pedido apresentado pela defesa dos réus, foi realizada contraprova de microcomparação balística em projétil recolhido da cena do crime e o fuzil de identificação RD 21580 utilizado na prática dos crimes.

A princípio, o Ministério Público esclarece que tal exame pericial já havia sido realizado logo após a prática delitiva, após a coleta do projétil da cena do crime e da apreensão da arma, por decisão judicial, à época proferida em caráter sigiloso. Naquela ocasião, em 23/12/2020, o laudo pericial proveniente da Perícia Forense do Estado do Ceará, concluiu que “o estojo incriminado teve sua espoleta percutida pelo percussor da arma de fogo 01, fuzil número de série RD 21580”.

Ocorre que, a par da conclusão do órgão de perícia oficial, a defesa dos réus insistiu pela realização da produção de contraprova, e mesmo com posicionamento contrário do Ministério Público, foi realizada em 17/11/2021. No exame posterior, o perito concluiu, por sua vez, que o estojo incriminado não teve sua espoleta percutida pelo “atual percussor” da arma de fogo 01, fuzil número de série RD 21580.

A conclusão em questão está distante de fragilizar ou descredibilizar qualquer das provas colhidas durante a instrução da Ação Penal, bem como da investigação da Polícia Civil, em especial da primeira prova pericial acostada aos autos e produzida logo após o cometimento da Chacina, quando o projétil coletado na cena dos crimes e a arma de fogo, apreendida por decisão judicial sigilosa, estavam devidamente apreendidos e acautelados.

A contraprova pericial somente foi realizada mais de 01 (um) ano após a prática dos homicídios. O fuzil número de série RD 21580, após ser submetido ao primeiro exame pericial, voltou para o uso ordinário da Polícia Militar, passando, conforme as escalas de trabalho, pela guarda e utilização de múltiplos agentes de segurança. Como consequência, a arma apresentada para produção pericial não mais apresentava a etiqueta do lacre de sua remessa ao setor de Perícia do Estado, até mesmo o cano da arma apresentava obstrução por material arenoso.

Importante mencionar que tal tipo de artefato não possui numeração em todas as suas partes, a exemplo do cano da arma, que é o componente utilizado para produzir as marcas submetidas a microcomparação balística no projétil, mas exclusivamente, em seu mecanismo central. Assim, o intercâmbio ou troca de peças entre armas do mesmo tipo e calibre, no tempo em que o fuzil foi regularmente utilizado, inviabiliza sua utilização como fonte de prova confiável atualmente.

O perito expressamente menciona que “(…) as peças internas da referida arma, em especial o extrator, ejetor, percussor e culatra do mecanismo de disparo e extração não possuem numeração que as individualizem, portanto, são completamente intercambiáveis com outras armas do mesmo modelo e somente a cadeia de custódia poderia garantir a integridade completa da arma.”

Assim, de fato, há tão somente garantias de que o mecanismo central da arma submetida ao primeiro exame pericial é igual ao da contraprova. Quanto aos demais componentes, nada há, além de mera suposição, de que são coincidentes aos da arma original, circunstância que é de conhecimento do Poder Judiciário e será valorado, através do Colegiado de Magistrados que atua no processo criminal n. 0050171-56.2021.8.06.0171.

Por fim, o Ministério Público do Estado do Ceará renova o compromisso com a sociedade na divulgação de informações claras, correta aplicação da legislação, assim como zelo e vigilância pelo interesse público.

Assessoria de Imprensa do MP

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